quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

IV - La Cara al Vent (I)

[Acabava de cumprir dezassete anos (Espanha, 1963), e um dia, à saída de uma reunião na paróquia, um "padre vermelho", daqueles que chamávamos de vocação tardia - o padre Manolo -, ofereceu-me um pequeno disco com quatro canções, que lhe tinham mandado de uma comunidade cristã de Barcelona. "Está cantado em Catalão - disse-me -, mas vais ver, é muito bom e tem muita força".
Cheguei a casa, fechei-me no meu quarto e ouvi, já não me lembro quantas vezes, aquelas quatro canções; quatro canções lograram revolucionar todos os meus sentimentos.

Fernando G. Lucini, in "Crónica Cantada de los Silencios Rotos"
]


O despido percurso de Xátiva a Valência do ano 59, provavelmente num fim-de-semana, vai tornar-se mais decisivo que as suas excursões "para o norte, onde dizem que a gente é mais limpa e nobre, culta e rica, livre, estimulante e feliz", segundo um dos mais conhecidos poemas de Salvador Espriu, que, por acaso, Raimon nunca musicou. O poema dá-nos a medida do fascínio que o estrangeiro suscitava, olhando para cima, por parte dos habitantes de uma terra triste e pobre em recursos e habitada por castigados sobreviventes de uma guerra civil. Mas no voo doméstico de Xátiva a Valência, numa moto de marca Vespa, hoje pérola de antiquários e fetichistas da pré-história do motor, Raimon engendra a sua primeira canção, "Al Vent".

Primeiro disco de Raimon (1963), disco histórico que incluía as míticas "Al Vent", "La Pedra", "Som" e "A Colps". "Al Vent" é a sétima canção que podemos ouvir na caixa de música. Não é versão original, deste disco, com muita pena minha, que ouvimos, mas a que cantou no Palácio dos Desportos de Madrid, em 5 de Fevereiro de 1976, e que está registada no disco El Recital de Madrid.Não vou traduzir esta canção. O "crit" de Raimon basta por si para nos despertar o que ela significa. Continuaremos a falar dela, em próximos artigos.]

Al vent,
la cara al vent,
el cor al vent,
les mans al vent,
els ulls al vent,
al vent del món.

I tots,
tots plens de nit,
buscant la llum,
buscant la pau,
buscant a déu,
al vent del món.

La vida ens dóna penes,
ja el nàixer és un gran plor:
la vida pot ser eixe plor;
però nosaltres

al vent,
la cara al vent,
el cor al vent,
les mans al vent,
els ulls al vent,
al vent del món.

I tots,
tots plens de nit,
buscant la llum,
buscant la pau,
buscant a déu,
al vent del món.

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