Manuel Vázquez Montalbán morreu em Bangkok, cenário de um dos seus romances, no dia 18 de Outubro de 2003. Vázquez Montalbán era um dos grandes amigos de Raimon. Vázquez e Anna Sallés, a sua esposa, historiadora, e Raimon e Annalisa viam-se com frequência, tinham jantares juntos, celabrações familiares - aniversários, o doutoramento de Anna, os prémios literários de Manolo... -, viajavam. Sobretudo, falavam, ouviam-se, inquietavam-se e compartilhavam muitas coisas; compartir, este verbo faz com que a própria vida se encare em comum. Raimon e Vázquez Montalbán compartilhavam ideias, maneiras de ver a vida, o gosto pela literatura e a gastronomia. E pela música popular, que Vázquez conhecia ao ponto de ter escrito alguns livros sobre o tema. Bem cedo se interessaria pelo fenómeno do aggiornamento da nossa música popular, e dissertá-lo-ia numa Antologia de la Nova Cançó Catalana. Depois tornou-se patente a sua afeição pela copla e outras variantes da sua língua materna ouvidas na infância e, de facto, escreve o romance com o qual o detective Pepe Carvalho salta para a fama a partir de um bolero cantado por Concha Piquer, "Tatuaje". Tudo isto aproxima-o de Serrat, a quem biografa.
Raimon canta na memória que lhe foi feita na Universidade de Barcelona, em 21 de Outubro de 2003. A Raimon, sempre irónico e simpático, muda-se-lhe a face quando lembra os seus amigos já falecidos, ausências irreversíveis, um vazio que nunca será preenchido. Vázquez Montalbán (1939-2003) foi o último; antes, Joan Fuster (1922-1992), Enric Gispert (1925-1990), Salvador Espriu (1913-1985).
Raimon canta na memória que lhe foi feita na Universidade de Barcelona, em 21 de Outubro de 2003. A Raimon, sempre irónico e simpático, muda-se-lhe a face quando lembra os seus amigos já falecidos, ausências irreversíveis, um vazio que nunca será preenchido. Vázquez Montalbán (1939-2003) foi o último; antes, Joan Fuster (1922-1992), Enric Gispert (1925-1990), Salvador Espriu (1913-1985).
Falou-se muito de Joan Fuster, porque estávamos nos inícios de Raimon e, naqueles tempos, o escritor de Sueca foi uma personagem-chave na sua passagem da História à Canção. Fuster era um multifacetado da cultura, um intelectual completo, um homem do Renascimento, lúcido e lúdico. Desde os seus artigos até à Cátedra de Literatura que ocupou os últimos anos da sua vida, passando pela sua diversa bibliografia, Fuster foi um dos cérebros mais influentes do nosso século XX. Sobre Raimon escreveu bastante, a começar pelo livro que já mencionámos, uma primeira edição com capa, e também fotos no interior, de Oriol Maspons, o número 16 da colecção "Biografies Populars", da Editora Alcides: Raimon era o quarto músico, antecedido por Josep-Anselm Clavé, Victòria dels Àngels e Raquel Meller.
Esta breve lista dá-nos a ideia da popularidade atingida por Raimon, comparável ao fundador dos coros com maior implantação no país, à soprano catalã de voz mais esquisita, à "cupletista" [de cuplet) de maior renome e caché, que tornou tão famosa "La Violetera" que até Charlie Chaplin a lembrou e tem uma estátua no Paral.lel [estação do metro de Barcelona]. Com uma diferença: Clavé e Meller eram história, Victòria dels Àngels tinha acabado de triunfar na inexpugnável fortaleza wagneriana de Beirute, na maturidade vocal, e Raimon era um moço de vinte e quatro anos, com apenas uma dúzia de canções como repertório.
Fuster também escreveu um dos textos de apresentação de Raimon. Totes les Cançons, incluído na reedição do livro de Fuster feita pelas Edicions de la Magrana, no ano de 1988. No fim desse comentário na primeira recolha da sua obra, em discos de vinil, Raimon escreve no diário Les Hores Guanyades este entranhável parágrafo sobre Fuster, datado de 20 de Abril de 1981, no qual entrevemos qual é o seu maior conceito de amizade:
Jantámos com Fuster, em Sueca. Diz-nos que já leva vinte folhas para a apresentação dos vinte anos de Raimon. Assegura-nos que praticamente deixou de escrever artigos para se concentrar na escrita da apresentação. Que dias maravilhosos! A Annalisa e eu sentimo-nos lisonjeados. Se os amigos te estimam e to demonstram, já podem vir os inimigos, que sejam bem-vindos.
De Gispert também se falou. Esperou-o à sua chegada a Barcelona e foi a sombra criativa em todas as suas gravações; Raimon deixou o seu nome nos agradecimentos em tantos e tantos discos, em alguns dos quais interveio muito nos arranjos, como agora na emblemtática "Veles i Vents". Gispert sabia muito de música, mas de música sabiam poucos, para dizê-lo a jogar com as palavras. Falava baixo e apenas quando se lhe pedia. Além dos estudos musicais e de dirigir a grupo Ars Musicae, tinha cursado Direito, mas vivia de uma loja onde torrava café e vendia frutas secas, no bairro da Ribera, que por fim o tornaria mestre da capela de Santa Maria del Mar. Gispert seria director do coro, investigador de música antiga, produtor discográfico e crítico, um grande crítico, o melhor da sua geração, em que competia com inlustres compositores.
Tinha estudado muito o Raimon músico, facto do qual deixou provas no texto que também acompanhava a caixa Raimon. Totes les Cançons, e um tratado sobre o tema foi a última coisa que deixou por fazer. Eram dias de estudo, um seminário sobre a obra de Raimon, organizadas pelo CIC de Terrassa, no âmbito dos cinquenta anos do cantor, na primeira semana de Dezembro de 1990. Gispert, já muito doente, morreria no dia 27 desse mesmo mês.
Fuster também escreveu um dos textos de apresentação de Raimon. Totes les Cançons, incluído na reedição do livro de Fuster feita pelas Edicions de la Magrana, no ano de 1988. No fim desse comentário na primeira recolha da sua obra, em discos de vinil, Raimon escreve no diário Les Hores Guanyades este entranhável parágrafo sobre Fuster, datado de 20 de Abril de 1981, no qual entrevemos qual é o seu maior conceito de amizade:
Jantámos com Fuster, em Sueca. Diz-nos que já leva vinte folhas para a apresentação dos vinte anos de Raimon. Assegura-nos que praticamente deixou de escrever artigos para se concentrar na escrita da apresentação. Que dias maravilhosos! A Annalisa e eu sentimo-nos lisonjeados. Se os amigos te estimam e to demonstram, já podem vir os inimigos, que sejam bem-vindos.
De Gispert também se falou. Esperou-o à sua chegada a Barcelona e foi a sombra criativa em todas as suas gravações; Raimon deixou o seu nome nos agradecimentos em tantos e tantos discos, em alguns dos quais interveio muito nos arranjos, como agora na emblemtática "Veles i Vents". Gispert sabia muito de música, mas de música sabiam poucos, para dizê-lo a jogar com as palavras. Falava baixo e apenas quando se lhe pedia. Além dos estudos musicais e de dirigir a grupo Ars Musicae, tinha cursado Direito, mas vivia de uma loja onde torrava café e vendia frutas secas, no bairro da Ribera, que por fim o tornaria mestre da capela de Santa Maria del Mar. Gispert seria director do coro, investigador de música antiga, produtor discográfico e crítico, um grande crítico, o melhor da sua geração, em que competia com inlustres compositores.
Tinha estudado muito o Raimon músico, facto do qual deixou provas no texto que também acompanhava a caixa Raimon. Totes les Cançons, e um tratado sobre o tema foi a última coisa que deixou por fazer. Eram dias de estudo, um seminário sobre a obra de Raimon, organizadas pelo CIC de Terrassa, no âmbito dos cinquenta anos do cantor, na primeira semana de Dezembro de 1990. Gispert, já muito doente, morreria no dia 27 desse mesmo mês.
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